Seguidores

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Todo psicólogo é louco? Não se iluda. Nem um pouco!

Foto: Google Imagens

“De médico e louco todo mundo tem um pouco”. Essa frase é bastante conhecida e se extendeu aos psicólogos porque vinha dos psiquiatras, profissão afim. Freud também disse “de perto ninguém é normal”. Concordo e nem gosto da palavra normal.

Mas daí, inventaram de repetir a asneira que todo psicólogo é meio doido. Nada contra os loucos, mas verdade seja dita, ficar falando isso de forma desqualificatória, descuidada, jocosa e pejorativa é, no mínimo, tolice.

Muitas vezes um louco é bem mais lúcido que um pseudo equilibrado que se intitula "normal".

Normal? Que palavrinha mais medíocre e seu conceito é bem arbitrário. Nunca quis ser normal.

Outra confusão é a idéia contrária. Achar que um psicólogo é incompetente em seu ofício só porque é espontâneo em seus momentos de lazer.

Acontece que ao invés de repetir asneiras diversas, porque não questionamos a repetição e o que estamos falando?

Normalmente as pessoas, formadas em psicologia, percorrem um caminho que envolve se submeter a processos psicoterapêuticos, ver e estudar a doença mental de perto. Aprendem que enxergar que por trás das melhores aparências podem morar histórias bem mal resolvidas, ter a certeza de que todos nós maquiamos a realidade e que sonhos são verdadeiros “mapas da minha”.

Sabemos que nada em nossa vida passa despercebido, que nada é tão simples e que não esquecemos absolutamente nada, nós guardamos em alguma gavetinha do nosso inconsciente, com uma plaquinha do lado de fora indicando que tipo de sentimento se refere àquele material guardado.

O ser que estudou psicologia com afinco e mergulhou em suas profundezas de alguma forma ou com algum trabalho transpessoal direcionado, tem a certeza de que entre o céu e a terra há mais mistérios do que a nossa vã filosofia é capaz de imaginar, assim como disse o grande gênio Shakeaspeare.

Portando, por esse saber e entender, esse indivíduo psicólogo pode ver a vida de forma um pouco diferente. Louco? Não, nem um pouco! Ele só tem uma tendência e ter relação mais estudada com o externo, observa o contexto por uma ótica mais científica, mais requintada digamos, treinada, como se usasse uma lupa imaginária. E quando esse psicólogo deflagra algo que um alguém não quer ver ou não concorda, então esse alguém se rebela, pois não queria ter consciência daquilo. Natural, é difícil se encarar.

Esperam que ele seja sério, concentrado, sorria contidamente, fale com clareza, não tenha dúvidas sobre nada, muito menos problemas pessoais. Será que existe alguém assim? E se ele é muito sério no lazer ou muito exigente em seus gostos pessoais o chamam de chato.

Costumam exigir um equilíbrio inexplicável dos psicólogos ou acham que todos são meio loucos. Eles não podem ter falhas? Isso significaria falhar em seus consultórios? Um médico não pode ter problemas de saúde, um economista passar por uma crise financeira ou um advogado sofrer um processo?

Psicólogos podem sim, ter dúvidas e problemas, mas o que vai diferenciá-los talvez das outras pessoas é a forma de resolvê-los, entendê-los, solucioná-los e manejá-los. Ser psicólogo pode facilitar, mas ele continuará sendo humano, cercado de outros humanos que constroem a vida com ele.

Será que dá para olhar uma pessoa alegre, em seu momento de lazer e só porque ele é psicólogo dizer: “Esse aí é meio maluquinho para ser psicólogo”?

A pessoa que faz esse “diagnóstico” com um CID* inventado na hora compara a alegria e a espontaneidade à loucura e ainda julga esse estado humano como incompatível com a profissão desse alguém, como se este alguém estivesse atuando como psicólogo 24 horas?

Além do mais, aprendemos na faculdade que o que faz de nós capazes de sermos um psicólogo com excelência e ter a capacidade de empatizar é justamente  sermos humanos e provar das mesmas delícias e dores que qualquer um que vem até nós pedir ajuda. No consultório, vestindo a “função”, treinados e munidos de teoria e sensibilidade é que vamos construir com o paciente um caminho de reconhecimento de tudo que é verdadeiro e que faz mais sentido para ele, e assim encontrar saídas em busca de  amadurecimento.

No geral, as pessoas insistem em duvidar dos outros. Costumar duvidar da capacidade tecnica de um psicólogo, julgando-o em seus momentos de lazer, pode significar “jogar a toalha” e dizer, “nunca farei terapia, não posso confiar num psicólogo, que é humano igual a mim”. Na verdade essa atitude mostra que você já duvida do humano mais importante: você!

*CID – Código Internacional de Doenças. Cada doença tem um código de identificação, que consta num livro (Manual).

Por Cintia Liana

Foto: Google Imagens

E por falar em julgar lúcidez e loucura, Clarice Lispector novamente me surpreende, "puxa-me pela mão e me mostra outra coisa linda que compôs":

"Sou composta por urgências: minhas alegrias são intensas; minhas tristezas, absolutas. Me entupo de ausências, me esvazio de excessos. Eu não caibo no estreito, eu só vivo nos extremos. Eu caminho, desequilibrada, em cima de uma linha tênue entre a lucidez e a loucura. De ter amigos eu gosto porque preciso de ajuda pra sentir, embora quem se relacione comigo saiba que é por conta-própria e auto-risco. O que tenho de mais obscuro, é o que me ilumina. E a minha lucidez é que é perigosa".

Foto: Mônica Montone Por Rogério Felício

Dentro do mesmo assunto, lembrei de um texto de uma grande amiga, *Mônica Montone:

..."Não acredito em Arte que não transforma, nem acredito em terapia que não atue no campo da mudança, mas na área das explicações causais. Assim como não acredito em boas intenções sem segundas intenções, tampouco loucura reluzente em néon na testa de qualquer careta que se diz doidão.

O verdadeiro louco, para mim, é o bufão, o louco do Tarot. Aquele que tudo sabe e nada diz. Aquele que aprendeu a olhar, mergulhar e conviver com seus dramas. Aquele que sabe usar a palavra certa para cada tipo de ouvido. Aquele que quer ir para o norte e vai, sem desviar, mesmo pegando atalhos. Aquele que sabe o momento exato de se calar. Aquele que sabe que as agressões nada mais são do que incapacidade de lidar com medos e frustrações e por isso espera, calmamente, o tempo do outro de chegar à leveza. O que diz coisas duras, sem perder a ternura jamais.... O que descobriu um caminho para a transformação do metal em ouro e gentilmente convida o Outro para um passeio pela mesma floresta... O que não pretende responder nadar, saber nada, mas, sentir e perceber tudo.... Não o candidato à vaga de artista só para demonstrar que é contra o sistema, para sair do anonimato ou para comer alguém...

Sei que é um trocadilho infame, mas, acredito que Arte não se faz com arte [leia sapequice].... Se faz com calma, alma, sangue, sublimação e anseio de transformação..."...

Lucidez e loucura, conceitos socialmente complicados, misturados com *preconceitos, medo de conhecer e preguiça de pensar.

*Preconceito (Dicionário Houaiss) - 1. Julgamento ou opinião concebida previamente. 2. Opinião formada sem fundamento justo ou conhecimento suficiente.

Por Cintia Liana

4 comentários:

Unknown disse...

COMO DIZ RAUL:"CONTROLANDO A MINHA MALUQUEZ MISTURADA COM MINHA LUCIDEZ VOU FICAR AAA FICAR COM CERTEZA MALUCO BELEZA".

Cintia Liana disse...

Raul Seixas, boa lembrança. Obrigada!
Raul foi Genial! Lindo!

Família de Manoel Gomes Aguiar disse...

Se todos os psicólogos fossem loucos,ah! que admiráveis loucos seriam!
O verdadeiro psicólogo,aquele vocacionado, que ama e vive sua profissão é um ser especial que, a despeito da sua própria vida , de suas inquietações e de seus problemas, se desnuda de tudo para ouvir e transmitir a tranqulidade curadora a seus pacientes.
Que falem os insensatos tentando macular a imagem do profissional pela sua maneira pessoal de ser, pela sua descontração, sua irreverência ,especialmente nos momentos de lazer.
o verdadeiro profissional da psicologia continuará sendo aquele anjo a acolher seus semelhantes, cada qual com sua maneira especial de ser, de reagir diante dos problemas,com sua aparente insanidade, porque, no mais das vezes, insanos são os que se julgam normais e desdenham de quem usa sua energia para mostrar ao outro que ele, na realidade, é humano e,como tal, tem emoçoes e tem direito a sentir e a ser quem é.
É nessa postura do psicólogo que o paciente encontra a cura. Antonia Roza (Aracaju-SE)

Cintia Liana disse...

Roza, que lindo! Obrigada, minha linda! Sinto-me muito honrada por seu lindo pouso aqui e por suas sábias e delicadas palavras. Um abraço.